O mercado permaneceu em compasso de espera, já que os dois principais eventos programados para a semana ocorrerão amanhã. O texto de ontem enfatizou a decisão de juros nos EUA, que é mais um capítulo importante para a história que Jerome Powell, Presidente do Fed, contará futuramente: o tipo de pouso que o BC americano entregará para a economia do país. Hoje, a ênfase do texto será na decisão do nosso comitê de política monetária, o Copom.
A curva de juros da B3 encerrou o dia precificando que a reunião de amanhã resultará em um aumento de 0,25% na Selic. Qualquer decisão de juros divergente seria uma grande surpresa e os efeitos nos preços dos ativos poderia ser razoavelmente negativo. Assumindo o cenário-base, sem surpresas na decisão de juros, o conteúdo do comunicado passa a ser protagonista – e motivos não faltam.
Primeiro para fornecer algum nível de previsibilidade sobre a condução da política monetária para os meses à frente, já que a taxa de juros brasileira, ao contrário do que se imaginava no início do ano, e tal qual um avião com problemas para pousar, teve de arremeter. Logo, estamos diante de um novo ciclo (espera-se que seja curto) de alta na Selic. Segundo ponto, complementar ao primeiro, a comunicação do BC será ferramenta importante no auxílio à reancoragem das expectativas de inflação à meta, que tem sido um problema relevante, como veremos a seguir.
A mesma curva de juros da B3 fornece outras informações relevantes. Dentre elas, Selic perto de 11,90% ao ano ao final de 2024 – o que na prática significa que mercado se divide, atualmente, entre as hipóteses de Selic em 11,75% ou 12,00%, já que as mudanças na taxa básica normalmente ocorrem em 0,25% ou 0,5% por reunião.
Discussões sobre a necessidade (ou não) de promover alta nos juros têm ocorrido há várias semanas. Uma forma de se avaliar qual deveria ser a taxa básica de juros é por meio da regra de Taylor. A regra diz, basicamente, o seguinte:
Taxa nominal de juros = juro real neutro + expectativa de inflação + 0,5 (expectativa de inflação – meta de inflação) + 0,5 (PIB corrente – PIB de longo prazo)
A partir daí é só inserir os dados e premissas. A taxa de juros real neutra assumida pelo BCB é de 4,75% ao ano; a meta de inflação é 3% ao ano; e o PIB de longo prazo poderá variar de acordo com o período utilizado. Aqui, para efeitos de exercício, chegou-se a 1,39% ao ano (o espaço está aberto para detalhar as premissas). Interpretando a fórmula, concluímos que quão maior for a diferença entre inflação esperada e meta de inflação, maior deverá ser a taxa de juros. O mesmo vale para o PIB: quão maior for a diferença entre o PIB atual e o PIB de longo prazo, maior será a taxa de juros nominal de acordo com a regra de Taylor.
Então, focaremos em dois fatores para estabelecer diferentes cenários e tentar compreender as premissas que levam à precificação de Selic entre 11,75% e 12% ao final de 2024: Expectativas de inflação (com folga o principal fator) e o PIB atual.
Em 5 de janeiro o boletim Focus tinha as seguintes projeções:
PIB 2024: 1,60%
IPCA 2025: 3,50%
Assumindo as premissas acima, a Selic prescrita por Taylor seria 8,61% – número semelhante a projeções feitas no início do ano.
Ontem, 16 de setembro, o boletim Focus tinha as seguintes projeções:
PIB 2024: 2,96%
IPCA 2025: 3,95%
Assumindo estes números, por Taylor, a Selic seria 9,96%. Haveria, neste cenário, espaço para corte de 0,50%. Entretanto, para que este cenário fosse viável, as expectativas de inflação e o PIB deveriam estar ancorados nestes patamares – algo que não acontece neste momento. A Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda (SPE/MF) revisou o PIB de 2024 para 3,2%. Tudo mais constante, ajustando somente a projeção para o PIB, chegamos a Selic em 10,08%.
Caso a estimativa de inflação utilizada seja um pouco mais conservadora do que atualmente se vê no Boletim Focus para 2025 (utilizando, por exemplo, a expectativa para inflação de 2024, atualmente em 4,35%, dentro da meta, mas perto do limite superior), a Selic encontrada seria de 10,68%. Neste cenário, a Selic deveria ser mais próxima à taxa atual, com algum viés de alta.
Então, por qual motivo o mercado precifica um aumento próximo de até 1,5% nos próximos meses? Uma possível resposta está na inflação implícita: a diferença entre os juros pré-fixados (os contratos de juros da B3) e a taxa pré que paga uma NTN-B equivalente (título público que paga IPCA+taxa pré) . Ao “subtrair” a taxa pré-fixada do contrato da B3 pela taxa pré da NTN-B chegamos à inflação implícita. Esse número é o que o mercado paga, o que agentes de mercado negociam (e não somente projetam, estimam). É dinheiro em jogo. E para o dinheiro em jogo, a estimativa de inflação é mais salgada. Hoje, a inflação implícita para 1 ano, calculada pela Anbima, encerrou o dia a 5,12%.
Voltando à regra de Taylor, utilizando o PIB projetado pelo Ministério da Fazenda para 2024 e a inflação implícita divulgada pela Anbima, chega-se a uma taxa Selic de 11,84% ao ano. A taxa do modelo fica bastante próxima à taxa negociada pelo mercado atualmente.
Dessa forma, conclui-se que o problema maior aparenta estar nas expectativas de inflação. O Banco Central é parte fundamental na missão de reancoragem das expectativas – e torna-se natural tentar cumprir o seu objetivo promovendo altas na taxa de juros. O outro ator de destaque nesta dinâmica é o próprio governo, principalmente pelo lado fiscal.
A ver o resultado da super-quarta.
Assim, o índice Bovespa encerrou o pregão em queda de 0,12%, a 134,960 pontos. O dólar comercial fechou em queda de 0,39%, a R$ 5,4883.
Boa noite e até amanhã.
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Felipe Galvão, CGA, CFP ®️;